A origem cultural do Orixá Exu está na África de cultura Nagô-yorubá, sem, no entanto dispensar a influência da cultura Gêge-fon de Elegbara.
Essa cultura africana é muito diferente da cultura europeia de base judaico-cristã, os limites entre sagrado e profano ocupam espaço diferente e a realidade é compreendida numa dimensão menos racionalizadora de nossos sentidos. Todo o mundo ocidental bebeu na influência do Iluminismo, Positivismo e Racionalismo. Quando falamos em cultura africana, falamos de um povo que tem a consciência de que a razão não dá conta de explicar o todo que está a nossa volta; dentro, fora e além do ser em suas realidades imanentes e transcendentes.
Exu ironiza a vida, ri da desgraça, dança sobre o fogo e domina a ilusão, principalmente aquela que nos envolve pelo ego, materialismo e vaidade. Ele domina todos os sentidos do apego, conhece nossas vaidades e vícios. Talvez por isso seja considerado o mais humano dos orixás e passa a ser o mais “temido”, pois quando Exu se mostra “igual a nós” ele nos assusta, simplesmente porque quer nos mostrar a dualidade humana, que hora nos leva para a luz e hora nos puxa para as trevas. Céu e Inferno, tudo ao mesmo tempo em nossa mente, o maior juiz, Exu joga e brinca com todos esses valores, e por isso ele assusta uns e faz temer a outros, no entanto, é tão Orixá quanto Oxalá, e as lendas mostram o quanto ele pode ser amigo, fiel, querido e até servo (mas não serviçal), pois é também senhor da magia, dos caminhos, das encruzilhadas, das portas e passagens, é quem permite a comunicação. E também é bem como mal, tanto amigo quanto inimigo, luz e trevas, Céu e Inferno.
A dualidade do Orixá Exu é como espelho refletindo a dualidade humana, sempre bom para quem é bom, mau para quem é mau, inimigo de quem é inimigo do sagrado.
Orixá Exu é o primeiro a ser saudado, logo, quem não saúda Orixá Exu não está saudando ninguém, numa cultura em que a religião é exclusivamente de Orixá, quem não está com Orixá Exu está desamparado, quem não tem respeito por Orixá Exu não tem respeito por ninguém, quem não reverencia Orixá Exu não reverencia o Sagrado, e aí chegamos ao conceito de que: “se você não saúda ou não oferenda Exu, ele te prejudica”. É uma forma de fazer compreender que Orixá Exu é Primordial, Essencial, Principal, Primeiro, e quem não está com Orixá Exu está sozinho e, sozinho, está por conta própria.
Porque Orixá Exu é “inimigo” do “inimigo” da fé (e não do homem), Exu é “contrário” àquele que está “contrário” à tradição (e não da vaidade), pois quem vai contra todos os valores milenares de sua tradição passa a ser uma ameaça ao que gerações e mais gerações lutaram para preservar. Aqui Orixá Exu atua como “instinto de preservação”, atendendo ao clamor de vozes ancestrais por proteção de sua cultura, povo e valores. Força, poder, vigor e fertilidade são alguns dos atributos que se vê e busca em Orixá Exu, é o que isso representa em sua origem cultural e para as outras culturas que hoje reinterpretam estes mesmos atributos em outro contexto.
Evocado e invocado pelos sentimentos mais nobres de uma tradição que busca sobreviver, Orixá Exu renova-se e recicla-se nos encontros e desencontros culturais de um País Miscigenado, de uma cultura heterogênea, na qual igual é ser diferente. Negro, Branco e Vermelho são as cores de base desse povo. Preto, Vermelho e Branco são as cores que Orixá Exu assumiu para si.
Quem nasce no seio da cultura de Exu (nagô-yorubá) e o respeita demonstra respeito por seus ancestrais e por todos os valores da terra. Exu é guardião desta terra, destes valores, é o Primeiro ser a vir ao mundo, é o ancestral de todos os ancestrais, desrespeito aos ancestrais é desrespeito a Exu, e daí é que vêm as lendas e conceitos de que Exu pune, Exu é vingativo, Exu é perverso, Exu é o mal, tanto quanto o bem... Pois a sua atuação para o bem ou para o mal muda segundo o ponto de vista de quem lhe observa. Para alguns interessa ter em seu panteão uma divindade que assuste e um mistério para seus interesses mesquinhos, que é na verdade apenas um espelho deles mesmos. Um dia entenderão que todo o mal que viam em Exu estava neles mesmos. Ainda assim muitos creem que Exu pode ser bom e ser mau ao mesmo tempo, ser neutro e manipulável.
Interprete Orixá Exu à luz de Oxalá, ao Amor de Oxum, à Lei de Ogum, com a Justiça de Xangô, nos Seios de Iemanjá, sob o Olhar de Egunitá. Como irmão de Oxóssi, melhor amigo de Orumilá-Ifá, caminhando com Omulu, curando com Obaluaê, deitado no colo de Nanã Boroquê. Exu que ouve Obá, dança com Iansã e troca receitas com Ossaim. Orixá Exu, Amor de Orixá Pomba-gira e ídolo de Orixá Exu Mirim. Orixá Exu nos mostra que todos são mistérios de um Mistério Maior. Todos os Orixás são partes de um Todo chamado Olorum. Nenhum é mais ou menos, todos têm seu grau de importância e função na criação, todos têm uma origem comum.
Exu é Orixá e Orixá é Sempre uma Divindade que Representa o Sagrado Transcendente.
Por isso não é tão fácil ler sobre Exu e saber interpretá-lo, além das palavras, compreender nas entrelinhas e estar acima de qualquer adjetivo negativo que lhe seja atribuído.
Afinal...
Exu se diverte com tudo isso.
Exu ri da ignorância humana.
Exu está acima do medo.
Exu está acima da vaidade.
Exu está acima de nossas visões humanas.
Exu mergulha em nossas paixões.
Exu sobe ao Céu e desce ao Inferno.
Da Luz as Trevas e das Trevas à Luz.
Quem pode com Exu?
Quem pode entender Exu?
Quem já esteve na Luz e nas Trevas e saiu ileso?
Não temos a menor ideia do que seja Luz Absoluta ou Trevas Absolutas,
Atribuímos conceitos humanos e limitados ao que consideramos luz e trevas.
Racionalizamos e consideramos relativos o bem e o mal segundo nosso interesse.
Exu está além de nossa compreensão e sabe que Ele mesmo é um mistério.
Exu transcende o humano e ao mesmo tempo se mostra humano.
Exu confunde esclarecendo e esclarece confundindo.
Ele brinca com o Ego e a Vaidade que Ele mesmo não tem.
Nós humanizamos Exu para torná-lo compreensível, e Exu ao se fazer compreensível mostra que somos patéticos,
Somos medíocres ao querer medir, pesar e rotular o transcendente.
Exu é um desses mistérios que nos coloca de frente com nossas paixões, nossos desejos, nossos apegos, nossos valores como num espelho.
Portanto, quando falar de Exu preste bem atenção, estará falando de si mesmo.
Pessoas Infelizes consideram Exu o mal,
Pessoas Medianas o consideram neutro,
Pessoas Despertas sabem que Exu é Luz.
Atribua valores de Luz ao Orixá Exu e ele se mostrará Luz a Você,
Aceite que Ele é um Mistério Sagrado do Divino Olorum e
Ele se mostrará Divino e Sagrado a você.
Exu assume e adota muitos dos valores que nós lhe atribuímos.
Porque a dualidade de Exu não é nada mais que o espelho da dualidade humana.
Exu é Vazio e cada um de nós escolhe com quais valores preenche este Vazio.
Bem... Espero que este texto sirva de introdução para a leitura de muitos outros textos aos quais a leitura e interpretação muitas vezes se fazem muito humanas. Lendas e Mitos que devem ser interpretados, mistérios que ocultam e revelam ao mesmo tempo. A quem tem olhos para ver o sagrado Ele se revela. A quem não tem Ele se oculta, em seus medos e fobias, afinal iniciado é quem venceu a morte e seus próprios medos e ao vencê-los faz uma outra leitura do mundo. E, como diria um certo oráculo, “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os Deuses e o Universo”, podemos dizer “Conhece-te a ti mesmo, ser humano, e conhecerás Orixá Exu, o mais humano dos Orixás”.
Salve todos os Exus!!!!
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